A participação da população Negra entre os pobres após 10 anos de combate à pobreza
Mário Theodoro
É consultor do Senado da República e ex-Secretário executivo da SEPPIR
A publicação da PNAD 2012 nos permite fazer um balanço de uma década de políticas de combate à pobreza. Os dados da pesquisa em 2002 se referem à situação antes do advento dos programas de transferência de renda do Partido dos Trabalhadores.
É fato que já no governo FHC já havia iniciativas nesse sentido, mas eram bem menos ambiciosas em seu escopo e na destinação de recursos. Nosso foco será, portanto, o período Lula-Dilma buscando trazer á tona alguns aspectos que nos parecem necessários ao debate sobre o combate à pobreza e à miséria.
O Programa Bolsa Família atinge hoje mais de 13 milhões de famílias. Até 2011, o programa havia retirado 14 milhões de pessoas da miséria; e a partir de 2011, com o advento do seu complemento, o Programa Brasil Sem Miséria, outros 22 milhões de brasileiros saíram da extrema pobreza. São números extraordinários e que dão a dimensão das mudanças atualmente em curso no país.
A despeito da expressiva queda do número de pobres, há algo interessante que se depreende do formato que a população pobre e extremamente pobre vai assumindo nesse processo de forte redução. Segundo se depreende dos dados apresentados pelo Ipea em recente publicação sobre a PNAD 2012, entre 2002 e 2012, justamente o período de atuação dos programas direcionados à redução da pobreza e da miséria, a participação da população negra entre os miseráveis cresceu 15%.
Isso significa dizer que a população branca está sendo atendida em primeiro lugar, deixando a população negra para traz. Tal ocorrência deve-se principalmente ao fato de que o perfil distributivo dos pobres faz com que a população branca esteja concentrada mais proximamente das fronteiras de saída.
Do mesmo modo, quando observamos a evolução contingente de pobres por raça/cor e gênero, temos a comprovação do viés. Entre 2002 e 2012, a participação da população branca entre os pobres caiu 19,6% enquanto que a participação da população negra subiu 8,2%. Quando fazemos o corte por gênero e raça/cor, observamos que a maior redução se deu no caso dos homens brancos, cuja participação caiu 22,4%, seguido das mulheres brancas cuja participação entre os pobres caiu 17%. Já para o caso da população negra, o maior aumento incidiu sobre a mulher negra, cuja participação entre os pobres cresceu 10,6%, enquanto que no caso dos homens negros esse percentual subiu 5,9%.
Entre 2002 e 2012:
Caiu a participação da população branca entre os pobres em 19,6%
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Subiu a participação da população negra entre os pobres em 8,2%
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Caiu a participação dos homens brancos em 22,4%
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Caiu a participação das mulheres brancas em 17%
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Subiu a participação dos homens negros em 5,9%
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Subiu a participação das mulheres negras em 10,6%
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Os números confirmam a dificuldade de se fazer políticas universais em um contexto social onde o racismo se faz presente. Via de regra, a tarefa de levar as ações governamentais à população em geral esbarra na realidade, nas condições objetivas de existência das pessoas. Entre os mais pobres, os negros são os mais pobres e, como tal, habitam nos locais mais longínquos, sobrevivem das atividades mais precárias, estão em posições de maior fragilidade social. E mesmo seu contato com a ação governamental é dificultado. É um fenômeno recorrente em nosso país. Os primeiramente contemplados pelas políticas públicas, mesmo aquelas dirigidas para os mais necessitados, têm sido sempre os grupos de população branca.
Por isso temos insistido na importância de políticas direcionadas para o enfrentamento da questão racial, notadamente na forma de ação afirmativa, como complemento indispensável às políticas sociais e às clássicas políticas de combate à pobreza e à miséria. Em uma sociedade que convive historicamente com o racismo, se não forem combatidos esses filtros raciais com a adoção das ações afirmativas, os resultados estarão pendendo sempre para o grupo não discriminado. E o Estado permanecerá funcionando como mais um elemento potencializador das disparidades raciais. Poderemos até erradicar a pobreza e a miséria, sem, no entanto, pormos fim à desigualdade.
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